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 Contardo Calligaris - Entrevista para Revista SER Médico(1ª parte)

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Edson
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Edson


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Contardo Calligaris - Entrevista para Revista SER Médico(1ª parte) Empty
MensagemAssunto: Contardo Calligaris - Entrevista para Revista SER Médico(1ª parte)   Contardo Calligaris - Entrevista para Revista SER Médico(1ª parte) Icon_minitimeSex 07 Nov 2008, 07:02

Uma entrevista onde ele aborda temas como sua formação, drogas, depressão e medicação.
Pode ser acessada em : http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Revista&id=371

Boa leitura

KM


Home > Publicações Cremesp || REVISTA
Edição 44 - Julho/Agosto/Setembro de 2008

ENTREVISTA (SM pág. 4)
Acompanhe entrevista empolgante - em todos os sentidos - com o conceituado psicanalista e escritor

Contardo Calligaris


“Sou psicólogo de gaiato, porque fui para Genebra e entrei em Filosofia, com opção em Epistemologia. (...) Ainda peguei Piaget ensinando, embora quase aposentado”


O psicanalista Contardo Calligaris, 60 anos, tem uma bagagem intelectual que impressiona. Estudou nos pólos culturais mais importantes da Europa, foi aluno de Jean Piaget e sua formação abarca diversas áreas, da filosofia à psicologia, passando pela literatura. Desde 1986, Calligaris mora parcialmente no Brasil onde atua como psicanalista, além de ser colunista do jornal Folha de São Paulo. Autor de diversos livros relacionados à psicanálise, lançou em abril o seu último desafio, a primeira obra de ficção, intitulada Contos de Amor, pela Companhia das Letras. Calligaris fala um pouco de sua trajetória e idéias nesta entrevista, concedida à equipe da Ser Médico (Caio Rosenthal e Ivolethe Duarte, conselheiro e jornalista do Cremesp, respectivamente) em seu consultório no bairro dos Jardins, na Capital paulista.


Ser: Você se considera um psicanalista jornalista ou um jornalista psicanalista?
Contardo Calligaris: Embora tenha começado tão cedo a colaborar com os jornais, sou um psicanalista que escreve.

Ser: Como começou essa história de escrever em jornal?
Calligaris: Quando estava na faculdade em Genebra, na Suíça, colaborava com uma pequena revista de filosofia política que se chamava Utopia. Depois, em 1967, passei a escrever resenhas e artigos de cultura para o jornal do Partido Comunista Italiano e comecei a ganhar um pouco de dinheiro com isso.

Ser: Você fez universidade na Suíça?
Calligaris: Sim, na Suíça fiquei bastante tempo. Também fiz doutorado na França – que acabou sendo em Psicologia Clínica, com um começo diferente. Tenho um percurso meio estranho dentro da Psicologia. Sou psicólogo de gaiato, porque fui para Genebra e entrei em Filosofia, com opção em Epistemologia – teoria do conhecimento. Claro, Genebra era a pátria de Piaget, que ainda estava ensinando – boa parte dos cursos era baseada em (Jean Jacques) Rosseau. Ainda peguei Piaget ensinando, embora quase aposentado. Então, me formei em Epistemologia e, ao mesmo tempo, fiz graduação em Letras que, aliás, foi providencial e me permitiu ensinar teoria da literatura em Genebra, imediatamente após me formar. E isso me permitia pagar a minha
análise em Paris.

Ser: Em que língua? Sua língua materna é o italiano?
Calligaris: Tudo isso em francês. Minha língua materna é o italiano, talvez o inglês. Eu sou milanês.

Ser: O que o motiva a fazer análises do cotidiano, de cinema, de livros no jornal Folha de São Paulo? A sua coluna parece um pouco acima do que o leitor médio espera da edição de quinta-feira de um jornal diário.
Calligaris: Tenho uma impressão contrária porque, no Brasil em particular, o leitor de jornal já é um público selecionado. Passei a escrever mais nos anos 90. O retorno que tenho é muito forte. E não estou falando apenas do retorno direto dos leitores, mas um jornal que tem um cotidiano importante possui o mesmo “ibope” que a televisão.

Ser: Você lê todos os e-mails dos leitores? Em média, quantos recebe diariamente?
Callegaris: Sim, claro. O número de respostas é completamente incerto porque, às vezes, uma coluna ruim (risos) produz muitos e-mails. Então, vai de 150 a 2.000, segundo o caso.

Ser: Na sua coluna há sempre referências ao cinema. Você é um cinéfilo?
Calligaris: Gosto muito de cinema, entre outras coisas. O interessante de um caderno cultural de jornal, além da parte informativa, é melhorar a qualidade da experiência das outras pessoas. Não no sentido de orientar, mas de tornar a vida cultural das pessoas mais intensa e de fazer com que possam ir ao cinema – sem, necessariamente, concordar com o que você viu no filme, mas com uma fruição mais interessante do que teriam se não lessem
o artigo.

Ser: Quando escreve, você pensa no leitor, considera que está prestando uma ajuda a ele ou simplesmente faz uma reflexão?
Calligaris: Penso no leitor, sim. Quando você escreve para um jornal, tem de escrever sobretudo para os leitores – e, em particular, não pode escrever para os problemas. A primeira coisa que se deve fazer é escrever para os leitores, mas isso não significa ser, necessariamente, pedagógico. Raríssimas vezes expresso opiniões.

Ser: O que sobrou de seu tempo de comunista?
Calligaris: Boa pergunta! Fui marxista, o que não era muito original para quem tinha 20 anos em 1968. Mas sobrou muito pouco já a partir do começo dos anos 70. O que restou foi uma disposição fundamentalmente anárquica e uma grande antipatia por todas as instituições em geral – de centro, direita ou esquerda. Como tenho posições um pouco anárquicas, elas são facilmente compatíveis tanto com as idéias da direita – que detestam o intervencionismo do Estado –, quanto com as de esquerda – que têm antipatia pelo autoritarismo.

Ser: E no Brasil, como você se define politicamente?
Calligaris: Eu tenho a vantagem de não ter que votar aqui. Isso é um privilégio, porque em geral não gosto de instituições, detesto as massas e comportamentos de grupo. Uma coisa que exaspera meus amigos – e, mais ainda os filhos de amigos – é que vejo um jogo de futebol e torço sincera e autenticamente pelo time que está jogando melhor. Eles ficam loucos porque gostariam que eu tivesse um time. Eu odeio torcida organizada, odeio pessoas que vestem, todas, a mesma camisa – fujo disso como da peste.

Ser: A aprovação do Lula pela maioria da população, como indicam as pesquisas é um comportamento de massa?
Calligaris: Não obrigatoriamente. No fundo, esses oito anos de governo Lula foram – pouco importa se graças a ele ou não – péssimos do ponto de vista de funcionamento partidário, mas excelentes para o país globalmente.

Ser: Por que pouco importa se graças a ele, ou não?
Calligaris: O porquê francamente eu não sei. Mas quem permitiu a retomada da economia brasileira, na verdade, não foi nem o PT, foi o Meirelles, e muito bem. O Lula teve a capacidade de manter o Meirelles e o Mantega ao mesmo tempo. O Lula ocupou o lugar de um jogador de meio campo, capacidade que ele possui provavelmente por ter sido um sindicalista importante, um homem de negociação. Ele não é uma estátua e está aí por alguma razão.

Ser: Na sua avaliação analítica como psicólogo, o que é que o Lula tem, já que apenas 11% acham que ele faz um governo ruim?
Calligaris: Difícil dizer.... Várias respostas triviais, e que todo mundo pode dar, tem a ver com o fato de o governo ter ficado mais funcional. Paradoxalmente, apesar da oratória e das comparações que faz de vez em quando, ele não é uma figura messiânica. Se você pensar na história do Brasil recente, o Lula não tem aquele aspecto messiânico autoconvencido de um Collor, por exemplo. Agora, ele tem uma faceta paternalista. Mas o Lula é uma figura política interessantemente diferente, que nada tem a ver com um Hugo Chávez, não só em relação às idéias políticas, mas também ao estilo de retórica de governo. O Lula é um social-democrata do tipo europeu.

Ser: Você estudou em Genebra, Paris, além de morar nos Estados Unidos. Por que resolveu viver em São Paulo?
Calligaris: Cheguei por acaso ao Brasil pela primeira vez, em 1985 ou 1986, porque estavam traduzindo um livro meu de psicanálise e leitura, que já tinha sido publicado em inglês, francês e espanhol. Eu vim fazer uma série de palestras em Buenos Aires, Porto Alegre e São Paulo. Eu nem sabia falar o português, só o espanhol. A partir daí, fui convidado a voltar no ano seguinte para fazer alguns seminários em Salvador, São Paulo e Porto Alegre. Em 1986, um pequeno grupo de paulistanos perguntou se eu toparia vir para São Paulo, por 15 dias a cada dois meses, pois eles queriam se organizar para fazer análise. Eu topei, era uma época muito especial...

Ser: Qual é a sua linha na psicanálise? Você se considera lacaniano?
Calligaris: Nunca me considerei lacaniano, embora fosse membro da escola de Lacan desde 1974. Isso porque a escola de Lacan se chamava Escola Freudiana de Paris. Lacan sempre achou que era um freudiano – embora isso não fosse verdade, era assim que ele se via. Eu sempre me considerei um freudiano, um releitor de Freud. Lacan certamente foi um ótimo releitor de Freud. O lacanismo no sentido estrito nasceu nos últimos anos de vida e, sobretudo, após a morte de Lacan.

Ser: Há mais de dez anos havia uma rigidez, principalmente dos freudianos, para se fazer quatro sessões de análise por semana – quando eram muito flexíveis faziam três. Hoje isso caiu por terra. Com o trânsito de São Paulo e todas as atividades, é impossível um executivo fazer análise três, quatro vezes por semana. Isso abala as estruturas freudianas?
Calligaris: Sou psicanalista porque tenho formação em psicanálise, mas não tenho nenhum problema em dizer que sou psicoterapeuta. Vejo a grande maioria de meus pacientes uma ou duas vezes por semana. Fazer análise nesse sentido não é uma finalidade nem para eles nem para mim – a não ser que seja um método de análise didática. Mas não faço formação, não me interessa mais, já fiz muito. O que me interessa é que meus pacientes recorram à análise para conseguir algumas mudanças que lhes permitam ter uma vida melhor. As pessoas que eu vejo têm problemas concretos.

Ser: Como fica a teoria freudiana diante de um casal homossexual que adota uma criança
recém-nascida?
Calligaris: Quando Freud fala de mãe, pai e companhia, na verdade está falando muito mais de funções do que de pessoas designadas. Eventualmente, alguém vai cuidar e exercitar a função materna. A adoção por casais homossexuais, masculinos ou femininos, é relativamente recente. Os dados começam a se tornar significativos, mas têm pouco mais de 15 anos. E as conseqüências quanto à orientação sexual do filho ou da filha são totalmente indiferentes. Eles têm a mesma chance de ser homossexual do que se fossem filhos de um casal absolutamente heterossexual. A sexualidade de alguém não é decidida por adoção da vida sexual do pai do mesmo sexo. Isso não significa que não tenha relação, mas se decide por uma série de caminhos que, certamente, têm a ver com o modo com que ele cresceu naquela família, naquele lugar histórico, com aqueles amigos, tia, cachorro, naquela escola etc.

Ser: Então, a pessoa não tem a orientação sexual definida ao nascer?
Calligaris: Essa é uma questão fortemente discutida. Sei que muitos colegas discordam, mas não acredito que a orientação sexual seja determinada geneticamente. Um estudo com gêmeos univitelinos demonstrou que 57% têm a mesma orientação sexual – embora os pesquisadores esperassem que fosse de 87% a 90%, porque o número de fatores que eles têm em comum são muitos. Então, os 57% representam um resultado negativo.
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